terça-feira, 19 de outubro de 2010

Sobre o tempo do amor

LÉO ROSA DE ANDRADE
Doutor em Direito pela UFSC. Psicólogo e Jornalista. Professor da Unisul.Site: www.leorosa.com.br

Lamenta-se muito a falta de amor. O mundo não estaria bem porque nós todos amaríamos de menos e de menos estaríamos sendo amados. Ao mesmo tempo, declaramos amor a tudo e amamos de todas as formas: garantimos amar os pais, os filhos, os vizinhos, o cachorro, o ursinho de pelúcia. Amamos, pela televisão, o artista da novela; pelo computador, alguém em um teclado distante. Amamos a nós mesmos, quando nos expomos sem pudor e senso de ridículo nos sites de relacionamento.

A rigor, parece que todo mundo ama todo mundo e por muitas formas. Ou então estamos deturpando a palavra amor. Temos de usá-la para significar gosto ou interesse por qualquer coisa. Ama-se a roupa, o veículo, o cachorro-quente. Creio que há declaração de amor em excesso no mundo. Mas esse é outro tipo de amor, falado sem compromisso, um uso vulgarizado da palavra. É uma questão coletiva. Estou pensando no amor privado, de um casal que se conhece, se envolve e se deseja.

Tenho gosto e curiosidade sobre como nasce, vive e morre uma paixão avassaladora. Cultivo dúvida, especialmente, sobre como sobrevive um amor que já morreu. Há versões de que um par se atrai pelo cheiro, por componentes bioquímicos, pelo fenótipo, por resistências a bactérias, por interesse, por relações de dominação, por busca de provimento. Talvez por tudo isso e algo mais.

Eu sei que o amor começa sem qualquer comedimento, com muitas promessas, com todas as ofertas, com uma busca ávida e insaciável do outro. Há um gozo inesgotável, mas que se enternece com um toque, uma palavra, um pequeno gesto. Quer tudo e contenta-se com pouco. É ciumento e generoso. Pede demais e dá-se todo. O amor é caprichoso e egoísta, mas, contrariando-se, dá ao outro um valor que vale por tão só existir.

Depois, é inacreditável, perde o vigor. O casal se compromete, um se apropria do outro, estabelecem-se limites para cada ser. Um pode-tudo se converte em proibição geral. Os devaneios sonhados juntos viram rotina. O prazer da presença vira obrigação. A pequena gentileza agora é dever doméstico.

Há uma conversão dos sentimentos: os prazeres se transformam em responsabilidades. A excitação incontrolável, quando muito, sobra como um carinho fraternal. Não há mais nem briga, só um cansaço. O fascínio acaba. O casal sobrevive e cada parte morre um pouco cada dia e vê o outro morrer do mesmo modo. É momento de ir e as partes não se vão. Os casais deveriam pensar bem, pensar com emoção. Se a chama, se o amor não tem como renascer, é hora de um novo amor.

Matériacedida gentilmente por Sandra Virgínia P. Evangelista (Advogada CRM)

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